CAMPO GRANDE (MS),

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    13/11/2018

    Como a crise na Venezuela incentiva o boom imobiliário em Miami

    Classe média venezuelana procura exílio em condomínios de luxo nos Estados Unidos, ainda que seja com dinheiro de corrupção 

    ©DIVULGAÇÃO
    À medida em que o capital venezuelano foge do país de origem, ele ajuda a mudar a cara de uma das cidades mais famosas dos Estados Unidos. Por causa da crise na Venezuela, Miami vive hoje um boom imobiliário de propriedades de luxo. 

    Segundo a Associação de Empresários Imobiliários de Miami (Miami-Dade Real Estate Investors Association, no nome original), nos últimos anos os venezuelanos compraram cerca de US$ 2 milhões (R$ 7,3 milhões) em condomínios e casas no sul do estado da Flórida. Isso representa 15% de todas as propriedades da cidade nas mãos de estrangeiros. "São os melhores clientes do exterior da indústria imobiliária daqui", diz Carlos Manga, corretor brasileiro que trabalha em uma consultoria local. 

    Miami sempre foi um destino conhecido pelos venezuelanos com dinheiro. Quando os problemas no país cresceram, muitos membros da classe média alta tradicional, como tantos outros latino-americanos, escolheram a cidade da Flórida como um dos destinos de refúgio. 

    Na época do governo do ex-presidente Hugo Chávez, morto em 2013, a cidade estadunidense era chamada de "exílio dourado" da nova burguesia que havia prosperado economicamente por causa do governo chavista. O próprio governante costumava brincar que uma passagem para Miami havia se tornado “tão acessível quanto tomar um café na padaria”. 

    No bairro de Brickell, em Miami, que é reconhecido na cidade pela melhor vista do mar, um conjunto de torres de apartamentos de luxo cresceu significativamente com a chegada dos venezuelanos. Nesta e em outras zonas pujantes da metrópole balneária, tanto o governo dos EUA como membros mais tradicionais do exílio da Venezuela que queixam da presença de uma "boliburguesia" -- empresários que lucraram durante o governo do presidente Nicolás Maduro e que, em alguns casos, foram até acusados de corrupção no país sul-americano. 

    Em 2016, Miami foi uma das cidades, ao lado de Nova York, em que as autoridades estadunidenses impuseram medidas de vigilância especial às transações de propriedades de luxo, na tentativa de impedir a lavagem de dinheiro por estrangeiros, incluindo venezuelanos. Em julho, o Departamento de Estado da Flórida anunciou a prisão de dois supostos participantes de uma operação de mais de US$ 1 milhão (R$ 3,6 milhões) para lavar fundos obtidos da estatal petrolífera venezuelana, a PDVSA, usando imóveis do sul da Flórida. 

    "Os supostos conspiradores incluem antigos funcionários da PDVSA, lavadores profissionais de dinheiro de terceiros e membros da elite venezuelana, às vezes conhecidos como 'boliburgueses'", diz um trecho da denúncia. 

    O jornal Miami Herald, na esteira das prisões, publicou em agosto que as autoridades dos EUA congelaram ao menos 17 propriedades de luxo de venezuelanos no sul da Flórida, com preços que variavam entre US$ 22 milhões (R$ 80,4 milhões) e US$ 35 milhões (R$ 127,9 milhões). Os observadores do setor imobiliário da cidade admitem preocupação com o fato de que, com as operações fiscais, a economia local poderia sofrer os impactos negativos da falta de demanda venezuelana. 

    "O investimento venezuelano em residências do sul da Flórida foi uma pedra angular no desenvolvimento de condomínios da região", afirmou o analista imobiliário estadunidense Peter McBride ao jornal Miami Herald. 

    "Por décadas, a indústria especulou que uma porcentagem indeterminada, mas significativa desses compradores estrangeiros estava investindo no estado para lavar seu dinheiro fruto de corrupção", continuou. 

    Ele ainda advertiu que medidas tomadas pelo governo estadunidense contra a lavagem de dinheiro, incluindo as investigações recentemente anunciadas em Miami contra venezuelanos suspeitos de corrupção, "enviou ondas de choque através do mercado de residências de luxo na cidade". 

    O extremo oposto da zona costeira de Miami e suas torres de luxo está em Doral, a capital indiscutível da classe média venezuelana exilada nos Estados Unidos, chamada na Flórida de "Doralzuela". A cidade também alimenta um boom imobiliário com a chegada de uma classe profissional gerencial da Venezuela que teve êxito nos EUA. 

    Os dados mais recentes do censo estadunidense dizem que há 366 mil venezuelanos no país. Metade desse número está na Flórida -- 54% são universitários e 20% já chega com uma pós-graduação no currículo. 

    A média de renda familiar chega a US$ 85 mil anuais (R$ 310,6 mil). Os venezuelanos nos Estados Unidos já possuem casa própria, tem rendas de outros bens e quase todos estão empregados. As cifras distanciam-se bastante da realidade da crise econômica que vive a Venezuela, onde a inflação anual beira os 1.000%. 



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