Desembargador faz balanço dos dois anos à frente da presidência do TJMS
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Desembargador João Maria Lós - Gerson Oliveira |
No próximo dia 27, o desembargador João Maria Lós encerra seu trabalho de dois anos como presidente do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul. Nesta entrevista, ele enfatiza os vários avanços conseguidos na melhoria dos serviços prestados à população, tanto na Capital quanto no interior. E aborda temas como demandas de processos, Casa da Mulher Brasileira, presídios e sobre a nova empreitada, desta vez no Tribunal Regional Eleitoral.
Após dois anos como presidente do Tribunal de Justiça o senhor se despede da função. Qual é o principal legado deixado por sua gestão?
JOÃO MARIA LÓS - O principal legado de nossa gestão foi a aproximação do Judiciário com a população. Foram várias iniciativas que fizemos, vários projetos que desenvolvemos, como a reinstalação das comarcas que tinham sido desativadas. Percebe-se que a presença do Judiciário é muito importante para estas pessoas. Esta aproximação é muito importante, penso que é o grande legado. Nós também tivemos a Carreta da Justiça sendo implantada e nestas cidades que já fomos temos atendido 10% da população. Quer dizer, atender 10% da população numa cidade, em uma semana, dez dias, é muito importante e gratificante. E, principalmente, o fato de que a carreta vai, faz júri, faz julgamento de processos possessórios, problemas de família, entre outros.
Há dois anos, o senhor disse que a ideia era melhorar os ganhos dos servidores com salários mais baixos. Isso ocorreu? De quais outras melhorias os servidores se beneficiaram?
Conseguimos implantar um mecanismo em que aqueles ocupantes de cargos em comissão, anualmente, incorporam 5% do salário para fins de aposentadoria. Porque tínhamos situação aqui em que o funcionário ganhava bem e, no momento da aposentadoria, perdia tudo isso e ficava em dificuldades. Nós criamos um mecanismo, que, se a pessoa ocupar o mesmo cargo ao longo de 20 anos, terá integralizado aquilo, incorporado em seus benefícios. O outro foi a equiparação entre técnicos de nível superior e o analista judiciário. Este último é a grande massa do judiciário, com 3 mil funcionários. E havia diferença salarial de 25% entre o técnico e o analista. E todos têm curso superior. Nós também apresentamos projeto de lei que foi aprovado e sancionado e já está implementado. Ao longo de cinco anos vamos equiparar estes salários.
O que foi feito em relação à demanda de processos?
Inauguramos o prédio do Cijus (Centro Integrado de Justiça), que tem toda a estrutura preparada para receber a Central de Processamento Eletrônico (CPE) para todo o Estado. Trata-se de um cartório digital, que atende todos os fóruns de MS. O juiz despacha lá em Porto Murtinho, o processo entra no fluxo do servidor da CPE e os servidores atendem o que foi determinado no despacho do juiz. E foi MS quem criou isso, nós criamos como CPE e em São Paulo eles fizeram e chamam de Cartório do Futuro. Vários estados estão copiando o modelo, mas o original é de MS. E estamos em fase de implantação ainda porque o prédio do Cejus foi inaugurado recentemente. Mas toda a estrutura está preparada para receber todos os cartórios do Estado. Tudo está sendo feito gradativamente, porque temos que transferir e treinar o servidor. Isso é feito gradualmente, porque se pegarmos avalanche de processos de todas as comarcas do Estado, haverá sobrecarga e vai tumultuar o processo. Cálculo de pena é feito todo por ali, execução de pena terminal rambém. Estamos pegando os pontos mais delicados, que têm maior urgência de dar celeridade. E lá - e este é o grande mecanismo - o funcionário trabalha apenas na frente do computador, no cumprimento do despacho do juiz, sem distrações. Nisso tudo, o rendimento do servidor vai de 3 a 5 vezes maior do que o cartório normal. Isso, então, gerou acúmulo de serviço no gabinete do juiz e estamos capacitando servidores para auxiliar nisso e dar o fluxo adequado. Logo, logo teremos celeridade pelo menos três vezes maior na tramitação dos processos.
Qual o valor do investimento e qual a economia proporcionada com a instalação do Centro Integrado de Justiça?
O investimento foi de R$ 38 milhões na compra do prédio e R$ 10 milhões mais ou menos para a reforma dele. Em termos de economia não é muita coisa, porque nós dispensamos um prédio que funcionava o Juizado, que veio para a CPE e um outro prédio onde funcionava a Coordenadoria de Infância e Juventude. No mais, a CPE - uma parte funcionava aqui no prédio. Mas a estrutura que foi montada e será implementada, esta sim, vai gerar economia em termos de desenvolvimento de processos e também economia em quantidade de servidores. Porque teremos um quadro de 400 a 500 servidores aproximadamente no CPE, que atenderá o Estado inteiro. Nas comarcas teremos diminuição do número de servidores. Os cartórios no interior, aos poucos, serão extintos, terá apenas o gabinete do juiz com a estrutura de apoio.
O número de novas ações foi reduzido em função da digitalização e/ou conciliação/mediação?
Da digitalização nem tanto, houve com ela celeridade e modernização. Mas na conciliação e mediação trouxeram resultados. Tivemos diminuição aproximada de mil processos no Tribunal e de 12,5 mil processos nas comarcas. É um primeiro passo. O número é pequeno, mas demonstra que vamos evoluir neste aspecto, porque ainda é um projeto embrionário o Cejus, implantamos vários deles nas comarcas, como por exemplo Campo Grande, Três Lagoas, Dourados, Naviraí, Ponta Porã. Nas cidades maiores já temos este Cejus, um setor que coordenada estas conciliações. E a ideia é expandir isso para todo o Estado. Mas tem que ser feito paulatinamente, porque o pessoal tem que ser preparado. Existe toda uma técnica que é desenvolvida tanto na conciliação como na mediação.
Neste cenário de funcionamento precário da Casa da Mulher Brasileira, o TJ-MS ainda mantém ali equipe especializada de atendimento?
Sim, tem toda a estrutura da Justiça continua lá. E isso tudo que ocorreu com a Casa é uma pena realmente. Espero que nesta próxima administração o prefeito se conscientize. Porque existe convênio celebrado entre o Governo do Estado , a Prefeitura e o Governo Federal, com a participação do Tribunal de Justiça, em que cada um tem suas responsabilidades. E ultimamente a Prefeitura não vinha cumprindo adequadamente com sua parte. A ideia é de que não se pare com este trabalho em prol da mulher. A Casa da Mulher Brasileira tem finalidade muito importante e vinha funcionando adequadamente. Se tornou uma referência, foi a primeira do Brasil. O Estado deve lutar para não extinguir este serviço tão importante. O prefeito novo deve voltar os olhos para isso.
Qual sua opinião sobre a nova Lei do Abuso de Autoridade. Precisa de aprimoramentos? Quais?
Eu sempre estive convicto que, cada vez que uma lei é feita no clamor de algum fato ocorrido, que tenha impressionado a população, não sai uma lei boa. Porque há um processo legislativo, tem um sistema legal vigente e a lei tem que se amoldar a isso. E a gente vê que, às vezes, no meio de um rompante, alguém elabora uma lei, apresenta isso no Congresso, há uma grita generalizada e muitas vezes faz-se uma lei ruim! Porque não se observa as técnicas legislativas, não se adapta ao sistema legal. E para o juiz isso é uma dificuldade muito grande. Você tem que usar a criatividade para amoldar os efeitos da lei à legalidade. Como esta lei [do abuso de autoridade] foi proposta em meio à Operação Lava-Jato, dando a impressão até de que é uma represália à atuação dos juízes, dos procuradores, acho que não é o momento adequado. Isso tem que esperar. Deixa resolver esta situação toda e depois, com calma, bom senso, elaborar uma lei que se atribua responsabilidades. Porque o abuso de autoridade existe há muito tempo. A legislação sobre isso existe há muito tempo, só que diante desta atuação da Lava Jato parece-me que estão querendo criar mecanismos para inibir a atuação do juiz e do promotor. E isso, sinceramente, não é devido. Você deve proibir e impedir o abuso, acho que isso deve ser feito, mas não se pode inibir a atuação de um juiz, de um promotor. Isso seria negar a justiça.
Sobre a crise prisional brasileira, o senhor acha que o Governo perdeu o controle da situação?
Penso que isso são coisas localizadas. Mas o que nós temos Brasil afora - e não é deste governo e nem do anterior, isso vem de muitos anos - é que não se investe em presídio. Investir em presídio não é construir um muro com cinco metros de altura, dividir com grade lá dentro e trancar o pessoal. O preso tem que trabalhar! A proposta no Congresso de fazer o preso trabalhar é o mínimo que tem que se exigir. A finalidade de ressocialização exige investimento e investimento correto. Temos em MS o exemplo da área do regime semi-aberto do dr. Albino Coimbra Neto, que é fantástico. Todos os presos trabalham, todos são remunerados e um percentual deste salário deles é retido para aplicar na reforma de escolas, de delegacia de polícia, gerando economia gigantesca para o Estado - foram economizados mais de R$ 4 milhões com este trabalho. Portanto, tudo funciona perfeitamente e estamos empenhados em disseminar isso para todo o Estado, pois só há vantagens. E isso tudo se deve ao trabalho do dr. Albino e à Agepen, que fez na Gameleira um trabalho bem organizado, fiscalizado, sendo rigoroso no cumprimento das regras, das exigências. É um trabalho que realmente ressocializa.
No início de sua gestão, o senhor anunciou realização de concursos para magistratura e servidores. Isso foi feito? Ou há previsão?
Fizemos o concurso da magistratura, homologamos no final de dezembro com os novos candidatos aprovados. Tivemos 4 mil candidatos no início e ficaram 19 aprovados. Na próxima administração já haverá 19 juízes para empossar. Também fizemos concurso para servidores do Poder Judiciário em Campo Grande, com 200 selecionados e empossados. E hoje não temos nenhum concurso aberto.
Que novos caminhos o aguardam na Justiça?
Agora eu concluo o mandato e fui indicado pelo Tribunal Pleno para o Tribunal Regional Eleitoral - eu e a desembargadora Tânia. Como ela já foi corregedora lá, deve ser a presidente e eu devo ficar como corregedor. E espero fazer um trabalho que colabore com nosso Estado.
O senhor tem ideias?
Acho que não há muito o que fazer porque o TRE, hoje, é muito bem estruturado, a Justiça Eleitoral é bem estruturada. O que eu penso é que, como a próxima eleição é estadual, pretendo fazer uma regulamentação sobre o que é permitido e o que é proibido durante o processo eleitoral. Aqui na presidência do TJ eu soube de muitas reclamações, principalmente das lideranças políticas, de que em cada município a legislação é interpretada de uma forma. Exemplo: numa cidade se pode fazer caminhada e na outra, não. E isso dificulta o processo eleitoral. Tenho a visão de que a eleição tem que ser um momento de festa, e há restrição muito grande hoje em matéria de propaganda. O dia da eleição em si é uma paradeira. A legislação hoje é rigorosa, mas não se pode restringir mais ainda. Porque não vejo como você vai convencer alguém a votar em determinado candidato porque ele trouxe uma dupla sertaneja para fazer um show durante o comício dele! A pessoa vai lá, assiste ao show e depois vota em outro candidato! Penso que isso não influencia eleição. O eleitor não é bobo, ele sabe o que está fazendo. Agora, o que se deve reprimir mesmo é o caixa 2, a compra de votos.
Fonte: CE
Por: CRISTINA MEDEIROS
Link original: http://www.correiodoestado.com.br/reportagens-especiais/o-grande-legado-de-nossa-gestao-foi-aproximar-o-judiciario-da/296101/