CAMPO GRANDE (MS),

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    06/05/2014

    Ponta Porã, MS - Linha do tempo: “Primo” Feis Aidar e o segredo de Ezmam

    “Há mais mistérios entre o céu e a terra do que sonha nossa vã filosofia”. (Willian Shakespeare, 24/04/1564 à 23/04/1616).


    Ezmam um misterioso andarilho e Feis Aidar “Primo”
    Foto: Arquivo pessoal de Gaze Aidar

    Cada ser humano dentro de sua individualidade tem seus segredos, e tais segredos podem ser mantidos guardados a sete chaves, não que tais segredos sejam de certa forma na maioria das vezes algo macabro, que tem como significado no dicionário formal (adj. fúnebre, ou que tem visos de coisa fúnebre: pensamento macabro, achado macabro) e no dicionário informal (algo que é muito louco, estranho, diferente, assustador, interessante, desconhecido, muito mal), mas também pode se dizer que segredos da infância, juventude, de acontecimentos familiares, negócios entre outros fatores do cotidiano da vida de cada um, que se tornam segredos.

    Quem algum dia de sua vida, já ficou guardião de um segredo! Mesmo que esse segredo não fosse diretamente ligado a ela, mas teve como missão ser o protetor de tal informação.

    Que significado tem a palavra “segredo”? Segundo dicionário formal da língua portuguesa, segredo significa (o que há de mais escondido, o que oculta à vista). Como escolher a pessoa certa para guardar uma informação um segredo?

    Na fronteira entre o Brasil e o Paraguai de outros tempos épocas, onde o silêncio valia ouro, saber pouco era o suficiente, e não saber, ou ver era algo era necessário para manter o sossego e a boa vizinhança. 

    Vamos realizar o resgate de um ilustre morador fronteiriço, que surgiu em meados do século XX, na região o famoso e popular “Primo” seu nome Feis Aidar, de origem árabe um comerciante visionário e empreendedor para seu tempo, fora ele o primeiro a construir para época um prédio em meios a casas, seria o primeiro do lado brasileiro, em cima era sua residência e na parte de baixo a famosa “Galeria Popular”, tal estrutura rendeu homenagens e felicitações ao “Primo” como era conhecido popularmente Feis Aidar, políticos, empresários e comerciantes locais foram na inauguração.

    Construção da Casa Popular de “Primo” Feis Aidar. Foto: Arquivo pessoal Gaze Aidar 

    Curiosidade que muitos fronteiriços na época falaram que o “Primo” teria encontrado um dos tesouros de Lopéz da “Guerra do Paraguai”, pois ele já possuía uma casa comercial de pequeno porte e construiu uma grandiosa estrutura para época, mas como todo causo vira lenda, essa história se espalhou por muito tempo, como todo bom comerciante de origem árabe, “Primo” sabia gastar o necessário e poupar para sempre ter, nunca esbanjou seus lucros, esta era a fonte de seu “tesouro”.

    “Primo” Feis Aidar com familiares e amigos.
    Foto: Arquivo pessoal Gaze Aidar

    “Primo” era muito procurado na região de fronteira, políticos famosos deste período histórico vinham se aconselhar com “Primo” respeitado por sua discrição, ele recepcionava seus patrícios do Oriente, que vinham para fronteira a passeio ou para investir no comercio local, diversas reuniões importantes, que influenciaram direta e indiretamente na política e no desenvolvimento fronteiriço, aconteceram neste período histórico na “Galeria Popular”. 

    Em certo período histórico da região de fronteira apareceu um homem misterioso, de origem europeia, seus olhos eram azuis, sua pele branca, tal homem procurou o “Primo” Feis Aidar, segundo relato deste acontecimento histórico, este homem que era conhecido na região fronteiriça como “Cigarrilho” ou “Bituca”, mas fora dado o nome de Ezmam pelo “Primo”. 

    Antes de Morrer “Primo” Feis Aidar, que guardou segredo de Ezmam por mais de 40 anos e nunca revelou a ninguém qual seria sua verdadeira identidade ou origem levou tal informação com ele. 

    O que seus familiares souberam partiu do relatado feito pelo próprio “Primo” Feis Aidar. Que certa vez Ezmam o procurou quando chegou à fronteira, era um homem de boa aparência, fino trato, pelo seu comportamento e linguajar deveria ter uma educação oriunda de boa linhagem e berço, podendo ser comparado a um nobre, por entender e falar vários idiomas, entre eles, “árabe”.

    Ezmam quando procurou Primo pediu que ele guardasse seus documentos e nunca entregasse e revelasse a ninguém seu nome ou origem, que esse segredo morresse com ele, “Primo” Feis Aidar aceitou ser o guardião do segredo de Ezmam.

    O “Primo” Feis Aidar por longos anos ajudou o andarilho Ezmam, com roupa e comida, propondo até moradia e arrumar uma companheira, mas Ezmam “cigarrilho” era relutante e nunca aceitou, o mesmo queria e morou até sua morte na rua perambulando entre a Rua Marechal Floriano e Avenida Brasil, especificamente perto do antigo Cine Teatro Brasil onde hoje existe uma igreja evangélica, dormindo por longa data em baixo do antigo coreto (é uma cobertura situada em praças e jardins, serve para abrigar bandas musicais em concertos ao ar livre e romarias), que existia na frente à igrejinha da Praça Lício Borralho, hoje onde se encontra o (Box internacional dos antigos cacilheiros e donos das barraquinhas de comerciantes informais de Pedro Juan Caballero), com a demolição da Igreja da linha internacional e do coreto, Ezmam passou a dormir em baixo de uma grande árvore que existia na pracinha em frente ao prédio da Galeria Popular do “Primo”. 

    Ezmam gostava de roupas escuras de cor marrom, um ponche ou jaqueta, manta e chapéu, quando necessitava de banho “Primo” rapidamente providenciava a higiene pessoal dele, digam de passagem era um andarilho diferente, pois não incomodava, nem atacava ninguém pedindo algo, isso se dava pelo fato do “Primo” providenciar comida e roupa para ele quando o mesmo necessitava de algo. 

    Ezmam tinha o apelido de “cigarrilho ou bituca” por pegar tocos de cigarro na rua ele não aceitava ganhar carteira ou cigarro de ninguém nem mesmo do “Primo” fumava somente tocos catados na rua.

    Um fato histórico ficou registrado na memória de muitos que ainda se encontram vivos destes tempos, sabem ou ouviram falar de tal acontecimento, como “Primo” Feis Aidar recebia sempre seus patrícios vindos do oriente, o ponto de encontro e reuniões era o prédio da Galeria Popular “Casa Popular” ou fora ou dentro da casa, pois as conversas eram sempre em outra língua no caso árabe, Ezmam “cigarrilho” ficava sentado na calçada observando discretamente como se não estivesse ali, como fumar nestes tempos era algo praticado por grande parte da população, “bitucas” de cigarro eram lançadas ao chão e Ezmam prontamente pegava, mas segundo fontes, na tradição árabe não se deve pegar nada que venha do chão, “lixo” por assim dizer, isso e considerado uma ofensa.

    Segue história de tal fato, que um patrício recém-chegado lançou ao chão uma “bituca” de cigarro, Ezmam pegou, o patrício começou a proferir dezenas de palavras em árabe em alto e bom tom, Ezmam se levantou e respondeu em árabe ao patrício, começou a dirigir a palavra a todos os presentes, “Primo” só observou o acontecido, enquanto Ezmam em árabe dava uma lição dizendo passagens do “Alcorão” livro sagrado “Mulçumano”, filosofando, mostrando conhecimento com as palavras, os presentes se calaram, Ezmam falou em (ÁRABE), mas também sabia falar segundo informação de “Primo” Feis Aidar em (INGLÊS, FRANCES, RUSSO, ALEMÃO E ESPANHOL), por ser andarilho e sempre andar sujo e calado, muitos achavam ele era um ignorante, mas neste dia o patrício pediu perdão ao andarilho e beijou sua mão, fato que ficou registrado na mente dos presentes.

    “Primo” Feis Aidar, uma única vez perguntou e questionou o motivo de tudo isso, por que viver na miséria? Na pobreza, no lixo passando fome, Ezmam somente disse: “você nunca saberá o que é miséria, pobreza, fome, e nunca saberá o que é viver sozinho, sem ninguém, na riqueza ou miséria até o mais sábio dos homens vira bicho”, segundo fontes Ezmam só falava em inglês ou árabe com “Primo” Feis Aidar. 

    Com a morte de Ezmam, o mesmo foi enterrado no cemitério Cristo Rei em Ponta Porã, seu local de sepultamento e a data de sua morte foram mantidos em segredo, “Primo” nunca informou o local certo, seus documentos, o “rimo” nunca revelou se enterrou com o Ezmam, ou que fez, esse segredo se perdeu com Ezmam e depois com a morte do “Primo” Feis Aidar.

    Outro mistério envolvendo Ezmam, que em certo tempo na região fronteiriça apareceu homens vindos da Europa, que perguntavam a todos sobre um homem com a discrição e semelhança de Ezmam o “cigarrilho”, que tal homem seria herdeiro de uma grande fortuna, que precisariam achar ele, pois somente ele poderia resgatar ou nomear seu tutor, ou o governo de tal país tomaria posse de todos seus bens, tais homens foram a encontro do “Primo” para questionar perguntar sobre Ezmam, “Primo” se recusou a responder ou dar qualquer informação sobre documentos ou sepultamento, “Primo” solicitou que tais homens fossem embora do país e deixassem Ezmam descansar em paz, tal pedido foi prontamente atendido, pois primo tinha grande influência em várias esferas publicas e de amizades dentro e fora do Brasil, por ser “Primo” um homem de confiança, conselheiro e amigo., muitos deizam na fronteira que “Primo” pertencia a alguma ordem ou organização secreta, isso foi mais um causo que virou lenda na fronteira. 

    “Primo” Feis Aidar escrevia para importantes estadistas dentro e fora do Brasil, governantes de alto posto “escalão”, elogiava, aconselhava e dava ideias, se preciso criticava também, segundo informações todas as cartas, telegramas e telefonemas que “Primo” enviava e realizava eram respondidos, por tais estadistas, segue relato que certa vez “Primo” Feis Aidar enviou uma carta ao vaticano endereçada sua Santidade o “PAPA” em seu conteúdo, opiniões, elogios e críticas, sobre muitos assuntos, tal carta fora recebida e para surpresa de todos, mas não de primo, uma resposta do vaticano via Itamarati órgão do Governo Federal, em forma de telefonema veio a “Primo” alguns meses depois, segundo fontes de familiares, o próprio pontífice fez questão de responder, em um telefonema, por ser “Primo” mulçumano, sua Santidade elogiou sua atitude e coragem, pois “Primo” Feis Aidar sempre buscou a paz e harmonia entre os povos. Tal fato é vivo na memória de muitos árabes amigos pessoais de “Primo” até os dias de hoje.

    Muito folclore e mistério envolveram a vida e a morte de Ezmam “cigarrilho ou bituca”, uns diziam que era nazista fugido da “Segunda Grande Guerra”, uns acreditavam ser ele um herdeiro Russo e outros um príncipe de alguma região da Europa, mas isso somente “Primo” poderia dizer, mas tal segredo e mistério irão manter se oculto, para sempre. 

    “Primo” Feis Aidar, faleceu em 1992, mas ainda é lembrado com carinho por todos que conviveram com essa figura política, histórica e cultural da região fronteiriça. Um homem além de seu tempo de caráter irrefutável e que sempre era mantinha a palavra dada, pois nesses tempos palavra valia tanto quanto documento assinado e o fio do bigode, ou você tinha ou não tinha. 

    “Mistério vem do grego, mistérion, coisa secreta, tem relação com a ação de calar a boca; o verbo é míein, fechar, se fechar, calar, místes, que se fecha o que guarda segredo, o iniciado”. 

    Agradeço ao amigo e Advogado Drº Gaze Aidar, pelas ricas informações que contribuíram para o relato deste fantástico fato histórico cultural, desconhecido pelos novos moradores e pelas novas gerações da nossa região fronteiriça.

    Relatar fatos do cotidiano histórico e cultural de um povo, mesmo estes cercados de muito mistério, mas que contribuíram para o desenvolvimento da região de fronteira, e de certa forma manter vivo nas lembranças, momentos épicos e reverenciar os pioneiros e visionários de seu tempo. 

    *Yhulds Giovani Pereira Bueno
    Pesquisador e historiador: Yhulds Giovani Pereira Bueno. Professor de qualificação profissional, gestão e logística (Programas Estaduais e Federias). Professor da Rede Municipal de Educação, membro do Grupo Xiru do CTG – Querência da Saudade – Ponta Porã – MS.