CAMPO GRANDE (MS),

  • LEIA TAMBÉM

    05/11/2019

    ARTIGO| O endurecimento do cumprimento das penas no Direito Penal Brasileiro

    Por: Leandro Soares*
    As mudanças englobadas como tendentes a endurecer o cumprimento das penas ocorreram, basicamente, em 3 legislações distintas: o Código Penal, a Lei de Crimes Hediondos (Lei n° 8.072/1990) e a Lei n° 12.850/2013 (que dispõe sobre organizações criminosas). As alterações, como se evidenciará, propostas atingem diretamente os criminosos habituais, os agentes de crimes hediondos e os líderes de facções criminosas. 

    Inicialmente, expõem-se as propostas concernentes ao Código Penal, a principal legislação criminal brasileira. Se aprovado, o Pacote Anticrime acrescentará ao art. 33 do Código Penal um quinto parágrafo. O mencionado artigo estabelece em quais regimes (fechado, semiaberto ou aberto) devem ser cumpridas as penas de reclusão e detenção e determina regramentos concernentes a isso. 

    O §5°, se acrescentado, obrigará o magistrado a estabelecer o regime fechado como inicial aos reincidentes ou àqueles que, verificados os elementos probatórios necessários, sejam considerados criminosos habituais/profissionais, ou seja, criminosos contumazes, que têm o crime como sua atividade principal de vida. A determinação do referido regime como inicial somente poderia deixar de ocorrer nos casos em que as infrações penais anteriores fossem insignificantes ou minimamente ofensivas. 

    O Pacote Anticrime ainda propõe, através do acréscimo dos parágrafos 6° e 7° ao mesmo art. 33 do Código Penal, que as penas também se iniciem em regime fechado para aqueles que cometem crimes de subtração, desvio ou apropriação de patrimônio alheio – seja, o patrimônio, particular (casos de roubos com emprego de arma de fogo ou destruição de obstáculos, ou nos casos em que o roubo for seguido de morte ou lesão corporal grave) ou público (peculato e as corrupções ativa e passiva). 

    Os delitos abarcados pelos dispositivos apontados no último parágrafo somente não serão punidos com regime inicial fechado nos casos em que todas – e não somente algumas – das circunstâncias do art. 59 do Código Penal forem favoráveis ao réu. O art. 59, como se sabe, traz critérios para a fixação da pena e de sua quantidade, seu regime inicial e as possibilidades de substituição, tais como os antecedentes do réu, sua conduta social, personalidade, os motivos do crime, dentre outros. Em outras palavras, todos os critérios estabelecidos pelo art. 59 devem ser positivos ao réu para que incida a mencionada exceção. 

    As alterações, conforme citado, não se restringem ao Código Penal, já que estendem-se também à Lei dos Crimes Hediondos (Lei nº 8.072/1990), atingindo significativamente seu art. 2°, o qual estabelece regramentos relativos aos crimes hediondos, à prática da tortura, ao tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e ao terrorismo. Este artigo, vigente atualmente, em seu § 2°, preceitua que a progressão do regime dos condenados naqueles crimes somente ocorrerá, para os réus primários, após cumprimento de 2/5 (dois quintos) da pena e posteriormente ao cumprimento de 3/5 (três quintos) para os reincidentes. 

    O Pacote Anticrime propõe que para todos que cometam os referidos crimes a saída do regime fechado somente seja possível após o cumprimento de 3/5 (três quintos) da pena, ou seja, estabelece, para todos (sejam primários ou não), a mesma regra que, atualmente, vige apenas para os reincidentes, o que deixa patente o endurecimento a que se propõe. 

    O cumprimento dessa fração de pena apontada no parágrafo anterior, todavia, não é a única condição autorizadora da progressão de regime, pois o §6° (mais uma proposta de acréscimo advinda do Pacote) estabelece ainda que devem ser constatadas evidências de que o criminoso não voltará a delinquir, sendo este um requisito cumulativo. 

    O Pacote ainda aventa a possibilidade de acréscimo de mais um parágrafo – o de número 7, portanto – o qual disporia que aos condenados por crimes hediondos, de tortura ou de terrorismo, durante o cumprimento do regime fechado e também do semiaberto correspondentes às suas respectivas penas, os mesmos estariam proibidos de ter acesso às saídas temporárias, salvo se para ida em audiências ou nos casos de “I - falecimento ou doença grave do cônjuge, companheira, ascendente, descendente ou irmão; II - necessidade de tratamento médico” (BRASIL, 1984), todos previstos no previstos no art. 120 da lei nº 7.210/1984 (lei de execução penal), sempre mediante escolta. 

    A última das mudanças propostas que visam diretamente o endurecimento das penas é a que ocorrerá na Lei nº 12.850/2013, que trata sobre organizações criminosas, através do acréscimo do §8° ao art. 2° da mencionada lei, o qual estabelece que deverão ser encaminhadas inicialmente para prisões de segurança máxima os líderes de organizações criminosas. Um nono parágrafo será ainda acrescentado ao mesmo artigo mencionado da Lei nº 12.850/2013 determinando que qualquer condenado que mantenha vínculos associativos com organizações criminosas não poderá progredir de regime enquanto tais relações perdurarem. 

    Ambos os acréscimos mencionados no parágrafo predecessor objetivam enfraquecer as poderosas facções existentes no Brasil. O isolamento de seus líderes faz com que as mesmas percam sua fonte de ideias e articulações, fragmentando o poder, antes uno, dentre diversos outros integrantes, o que, inevitavelmente, dificulta as ações das mesmas, bem como as relações entre seus membros; a criação de empecilhos para a liberdade de seus integrantes, por sua vez, objetiva o enfraquecimento numérico de tais organizações, as quais contarão com menos pessoas em liberdade para agirem em seu nome. 

    *Advogado



    Imprimir