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    05/05/2018

    ARTIGO| O fim do foro num país de privilegiados

    Por: Victoria Ângelo Bacon*
    Nesses Brasis acostumado aos privilégios não se liberta deles assim, tão facilmente. O Supremo discutiu por quase um ano se deveria restringir o foro especial de autoridades acusadas de crimes. Figuras políticas das mais diversas vertentes, e a própria Suprema Corte, têm alardeado o fim do famigerado “foro privilegiado” como o grande remédio para o país. Alegam eles que esse mecanismo se tornou uma máquina de impunidade para os poderosos e que o Brasil só caminhará para o futuro que merece quando o tal do “foro” acabar. 

    Curioso é que, embora mais de 55 mil autoridades gozem do privilégio de foro, o STF apenas limitou o direito para deputados e senadores, justo os cargos que o instituto do “foro privilegiado” mais intenciona proteger de ataques antidemocráticos. Ministros, juízes, promotores e outras autoridades seguem intocados, algo que poderia ser mudado através de alguma PEC, o que não acontecerá este ano já que a intervenção no Rio de Janeiro impede reformas na Constituição. 

    Os defensores da medida argumentam, por exemplo, que o julgamento de autoridades por tribunais superiores aumenta a impunidade pela demora das ações criminais nessas instâncias. Eduardo Azeredo, ex-Governador de Minas Gerais pelo PSDB, está aí para provar o contrário. Com crimes cometidos em 1998, o tucano segue livre, ainda sem dar início ao cumprimento de pena. 

    Independentemente de quem esteja demorando mais, é importante dizer que um julgamento célere é um direito previsto na Constituição, mas não é, por si só, uma garantia de um julgamento justo. De nada adianta uma ação judicial rápida que esmague outros direitos importantes como o contraditório e a ampla defesa. 

    Na prática, porém, o que vemos na atualidade é uma falência total da Justiça brasileira, onde as perseguições políticas tomaram todas as instâncias do Poder Judiciário no que chamamos de “judicialização da política”. No Brasil, a recente trajetória de Lula mostra bem que, se o fim do “foro privilegiado” pode causar insegurança jurídica, os Tribunais Superiores estão longe de garantirem isenção quanto a perseguições políticas. 

    Também não podemos falar que os membros de Tribunais Superiores estejam completamente livres de influências externas simplesmente por estarem em uma alta posição hierárquica. O que dizer, por exemplo, da ameaça via Twitter feita pelo General Villas Bôas ao STF um dia antes do julgamento do HC de Lula? 

    Enfim, ao contrário do que pregam os defensores do fim do “foro privilegiado”, levar casos de autoridades às instâncias inferiores não é garantia de justiça. É claro, porém, que o instituto do “foro privilegiado” não é perfeito e possui suas distorções. Para criticar tais problemas, porém, é preciso compreender melhor o que é esse tal de foro. 

    De nada adiantar extinguir o foro por prerrogativa de função se não mudarmos a estrutura geral do Judiciário, o Poder com menos mecanismos de participação popular do país. 

    *Secretária executiva
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