CAMPO GRANDE (MS),

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    18/02/2017

    Em quase 30 anos, Congresso aprovou 4 projetos de iniciativa popular

    Nenhum deles seguiu tramitação prevista para esse tipo de proposta, assim como aconteceu com o pacote de medidas contra a corrupção, devolvido para a Câmara.

    Divulgação
    Em quase 30 anos, o Congresso Nacional aprovou quatro projetos de iniciativa popular, entre eles a Lei da Ficha Limpa, mas nenhum deles foi tratado formalmente como sendo de autoria da população.

    Os projetos de iniciativa popular estão previstos na Constituição. Para serem apresentados pela sociedade, precisam do apoio de no mínimo 1% do eleitorado, além da adesão de 0,3% do eleitorado de pelo menos cinco estados da federação.

    Os quatro projetos de iniciativa popular aprovados no Congresso chegaram ao Legislativo com o apoio de mais 1 milhão de assinaturas de cidadãos comuns, mas todos acabaram sendo “adotados” por parlamentares, que os apresentaram como sendo seus autores. Em todos os casos, a Câmara alegou não ter estrutura para conferir as assinaturas.

    Diante disso, foram apreciados seguindo o rito de um projeto de lei comum. Essa dinâmica ocorreu com o projeto que originou a Lei da Ficha Limpa, com o projeto que tornou hediondo o crime de homicídio qualificado, o projeto de lei que coíbe o crime de compra de votos e o projeto de lei que criou o Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social (confira detalhes sobre cada um dos projetos ao final desta reportagem).

    Foi o que aconteceu também com o pacote com medidas de combate à corrupção, elaborado pelo Ministério Público e que teve mais de 2 milhões de signatários.

    O projeto passou na Câmara em novembro e seguiu para o Senado, mas a sua tramitação acabou suspensa por decisão liminar (provisória) do ministro do Supremo Tribunal Federal Luiz Fux.

    Ele determinou a devolução da matéria aos deputados por entender que houve um erro na tramitação. No entendimento dele, os deputados não podem se apropriar de um projeto de autoria popular porque isso “amesquinha a magnitude democrática e constitucional da iniciativa popular” e submete a proposta “aos meandros legislativos nem sempre permeáveis às vozes das ruas”.

    Outro ponto que embasou a decisão do ministro foi que o projeto de iniciativa popular tem que ser “debatido na sua essência, interditando-se emendas e substitutivos que desfigurem a proposta original para simular apoio público a um texto essencialmente distinto do subscrito por milhões de eleitores”.

    Ao aprovar o pacote, os deputados desfiguraram o texto original e incluíram uma emenda que tratava de punição a juízes e membros do Ministério Público que cometessem abuso de autoridade, tema que não constava do texto original.

    O projeto anticorrupção foi, então, devolvido à Câmara na última quinta-feira (16). O presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), chegou a criticar a liminar dizendo haver uma interferência do Judiciário no Legislativo e indicou que iria esperar uma decisão do plenário do Supremo sobre o que fazer.

    Diante da repercussão negativa sobre a paralisação da tramitação, Maia decidiu que será feita uma checagem das assinaturas pela Secretaria Geral da Câmara, a ser ratificada pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). A medida, segundo disse ao G1, será “excepcional”.

    A decisão de Maia levou Fux a determinar nesta sexta-feira (17) o arquivamento da ação que levou à suspensão da tramitação do projeto.

    Para evitar problemas em relação aos próximos projetos de iniciativa popular, Maia já disse que irá elaborar, em conjunto com o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), um projeto de lei com regras para validar as assinaturas.

    Projetos de iniciativa popular

    A apresentação de projetos desse tipo está prevista desde a Constituição Federal, de 1988. Em 1988, foi aprovada uma lei regulamentando os critérios para a sua apresentação.

    É necessária a adesão de no mínimo 1% do eleitorado brasileiro (em 2016, o Brasil tinha 144,1 milçhoes de eleitores), além da adesão de 0,3% do eleitorado de pelo menos cinco estados da federação. Assim, para que um projeto seja apresentado como sendo de iniciativa popular, são necessárias, atualmente, as assinaturas de cerca de 1,4 milhão de pessoas.

    Além do pacote anticorrupção, outras duas propostas de iniciativa popular tramitam na Câmara.

    Uma delas altera dispositivos do Código Penal para retirar o benefício relativo à fixação de pena para crime continuado quando se tratar de crime hediondo, tortura e genocídio. A proposta também proíbe a apelação em liberdade para o condenado por esses crimes e por tráfico de drogas, além do indulto para o crime de tortura. Atualmente, aguarda parecer em uma comissão especial.

    A segunda proposta destina 10% da receita corrente bruta da União ao Sistema Único de Saúde (SUS). Está parada na CCJ, onde aguarda parecer.

    Ambos os projetos, porém, também foram “adotados” por parlamentares, que se tornaram os seus autores.

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    Confira os quatro projetos de iniciativa popular aprovados até hoje:

    Lei 8.930/1994: o caso Daniella Perez

    Após a morte da atriz Daniella Perez, em 1992, a mãe dela, Glória Perez, autora de novelas, mobilizou uma campanha que conseguiu assinaturas suficientes para incluir homicídio qualificado no rol de crimes hediondos, que têm penas mais duras. O projeto foi sancionado em 1994.

    Lei 9.840/1999: combate à compra de votos

    Com o patrocínio da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, a lei aprovada coíbe o crime de compra de votos. Foi sancionada em 1999.

    Lei 11.124/2005: moradia popular

    A lei determinou a criação do Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social para garantir a pessoas de baixa renda o acesso a recursos para a construção, compra ou reforma da casa própria. Foi sancionada em 2005, após 13 anos de tramitação.

    Lei Complementar 135/2010: a Lei da Ficha Limpa

    Aprovada em 2010, a Lei da Ficha Limpa torna inelegível por oito anos a pessoa que tiver sido condenada em processos criminais em segunda instância, políticos cassados ou que tenham renunciado para evitar a cassação.



    Por Fernanda Calgaro, G1, Brasília


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