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    31/03/2020

    ARTIGO| Coronavírus e hospitais para internação

    Autor: Odilon de Oliveira*
    Segundo as autoridades da saúde, não há dúvidas de que os casos de coronavírus vão aumentar rapidamente. Por outro lado, a realidade brasileira mostra que o Brasil não possui estrutura para o enfrentamento dessa situação. Aliás, todo brasileiro, principalmente a população dependente do SUS, sabe disso, porque sente na pele.

    A rede privada tem em torno de 260 mil leitos para internação, mas perto de 80% da população brasileira, ou mais ou menos 172 milhões, não têm acesso a hospitais particulares. Toda essa gente depende do SUS, que tem apenas pouco mais de 300 mil leitos para internação de todos os tipos de doentes. Para a população do SUS, há 1,7 leito para cada grupo de 1.000 habitantes. Se 1% desta parte da população contrair o coronavírus e 1/3 dela precisar de internação, serão necessários 573 mil leitos.

    Enquanto o Brasil tem apenas 1,7 leito para cada grupo de mil habitantes, calcula-se que o ideal seria entre 2,5 e 3 leitos para a mesma quantidade de pessoas. E o pior é que, a cada ano, o Brasil sofre uma queda acentuada no número de leitos públicos. Nos últimos dez anos, a redução chegou a mais ou menos 35 mil.

    Mato Grosso do Sul não foge à regra nacional. Tem uma população de mais ou menos 2.700.000 habitantes. Supondo-se que 80% dependem do SUS, seriam 2.160.000 sem acesso a hospitais particulares. Se 1% desses 80% (21.600) contrair o vírus e 1/3 precisar de internação, serão necessários 7.200 leitos públicos. O Estado possui essa quantidade de leitos na rede pública de saúde? Claro que não. Os leitos que existem são insuficientes até para os casos de internação por doenças comuns.

    Então, não é correto o governo afirmar que o Estado tem estrutura para enfrentar o coronavírus. É claro que todos devemos nos unir para vencer essa epidemia, mas o convencimento da população, na área da prevenção, mais fácil se obtém falando a verdade. É melhor a população saber, por meio de seus governantes, que, no Brasil, toca a cada médico do SUS um grupo de em torno de 730 pessoas, enquanto em Cuba, são apenas 150.

    A direção máxima do Sistema Único de Saúde (SUS) é única, cabente à União através do Ministério da Saúde. Todavia, a Lei n. 8.080/90, que regula as ações e serviços de saúde em todo o território nacional, relaciona as atividades comuns e a competência individual de cada ente federativo. Dentre outras atribuições, cada Estado é responsável direto pela coordenação da saúde pública em sua plataforma territorial. Cabe à União a prestação de apoio técnico e financeiro aos Estados e estes aos respectivos municípios. É dos Estados também a responsabilidade direta pela coordenação da vigilância epidemiológica e sanitária. 

    Essa pandemia me faz trazer à tona uma outra catástrofe: a corrupção, praticada, no Brasil, em larga escala até recentemente, chegando a mais ou menos R$ 180 bilhões por ano, o que, seguindo-se as normas da ANVISA, daria para construir 720 mil leitos para internação.

    Aproveito o momento para sugerir aos parlamentares federais a apresentação de um projeto que retenha, no Estado da respectiva apreensão ou do confisco, 80% do valor dos bens e de valores originários do tráfico de drogas e da lavagem de dinheiro, para aplicação na área de saúde. Mato Grosso do Sul, por ser um Estado estrategicamente interessante para esse tipo de crimes, talvez seja o que mais recupere bens e valores. A Justiça Federal concentra enorme estoque patrimonial confiscado de organizações criminosas.

    A situação agora vivida supera os limites de cada Município e de cada Unidade Federativa. É de interesse global e afeta todas as direções da vida universal.

    *O autor é juiz federal aposentado e integra o Escritório Adriano Magno & Odilon de Oliveira e Advogados Associados.



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