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    07/12/2017

    ARTIGO| Captação clandestina de sinal de TV: Furto, estelionato ou fato atípico?

    Por: Dr. Guilherme Suriano Ourives*
    Atualmente, existe uma crescente demanda por aquisição de aparelhos que transmitem o sinal fechado de TV, seja via cabo, satélite ou internet. Com isso, cresce também a captação clandestina desse sinal.

    Acerca do tema, reflete-se que tal comportamento atinge diretamente a moral, a ética e os bons costumes, já que essa prática clandestina é amplamente difundida e utilizada em diversas classes sociais do país.

    Cabe aqui uma maior reflexão se essa atitude pode ser considerada crime ou não.

    No dia 4 de fevereiro de 2015, foi apresentado na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei nº 188/2015, de autoria do Deputado Cleber Verde (PRB-MA), que altera o artigo 155, do Decreto-Lei nº 2.848/1940 (Código Penal), incluindo no § 3º sinais de TV a cabo.

    Muito embora haja a possibilidade de tal conduta ser considerada crime, já que o projeto se encontra sujeito à apreciação do Plenário, vejamos o que diz o próprio artigo 155 do Código Penal:

    “Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel:

    Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.

    § 1º - A pena aumenta-se de um terço, se o crime é praticado durante o repouso noturno.

    § 2º - Se o criminoso é primário, e é de pequeno valor a coisa furtada, o juiz pode substituir a pena de reclusão pela de detenção, diminuí-la de um a dois terços, ou aplicar somente a pena de multa.

    § 3º - Equipara-se à coisa móvel a energia elétrica ou qualquer outra que tenha valor econômico.”

    Assim, com a inserção dessa conduta a ser tipificada como ilícita, cabe aqui uma análise dessa tipificação e se realmente poderia ser considerada furto.

    Apesar de o enquadramento desse projeto, com a inclusão no art. 155 do CP, parecer viável, tem-se que a jurisprudência vem divergindo no assunto.

    Ocorre que tal discussão se dá em três sentidos, qual seja: a) deve ser considerada furto – visão amplamente adotada pelo STJ; b) deve ser considerada estelionato – visão adotada em algumas doutrinas; c) deve ser considerada conduta atípica – visão adotada recentemente no STF.

    Deste modo, mesmo tendo a jurisprudência adotado por analogia que tal conduta pode ser tipificada como furto e até mesmo estelionato, note que não há cominação legal para descrever como ilícito penal, não podendo ser enquadrada como crime.

    Por outro lado, note que a Lei nº 8.977/1995, que dispõe sobre o serviço de TV a cabo, em seu art. 35, considera:
    Constitui ilícito penal a interceptação ou a recepção não autorizada dos sinais de TV a cabo.”
    Mesmo considerando ato ilícito, tal instrução não vem sendo adotada, uma vez que não há previsão na legislação penal, podendo levar ao entendimento de que o fato é atípico, ou seja, mesmo sendo um fato reprovável, consiste na ausência de correspondência, na falta do ajustamento, da adequação entre o fato natural e o modelo de conduta proibida: o tipo legal de crime.

    Assim, por completa ausência de tipificação dessa conduta, destaca-se o embate hermenêutico estendido ao longo do tempo até que o projeto em análise seja concluído. Sendo a decisão do STJ considerada a mais compreensível e ajustável à ciência jurídica penal, denota-se que, assim como a transmissão via cabo se dá através de energia, a transmissão e propagação do sinal via internet ou satélite através de ondas também seja considerada energia.

    *Advogado; Pós-graduado em Direito Civil e Processo Civil; Pós Graduando em Direito Penal e Processo Penal; Sócio do escritório Pegolo & Ourives Advogados Associados.


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