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    18/07/2017

    IDEOLOGIA| Sete pontos para entender o que é socialismo fabiano

    E por que ultimamente tanta gente está falando sobre ele nas redes sociais

    Desde que tomou posse como prefeito de Sao Paulo, João Doria tem sido alvo de críticas por supostamente estar alinhado ao fabianismo Rovena Rosa/Agência Brasil
    Socialismo fabiano se tornou a expressão da moda nas discussões sobre política em redes sociais. O termo aparece em várias postagens no Facebook, sendo que grande parte delas presume uma ligação entre o socialismo fabiano e o PSDB (Partido da Social Democracia Brasileira) e critica o possível candidato às eleições presidenciais de 2018 pelo partido, João Dória. 

    O frenesi nas redes sociais também fez com que muitas pessoas recorressem à internet para entender melhor o significado de tudo isso, tanto é que o Google Trends aponta que na última semana de junho houve um pico de buscas sobre o que é socialismo fabiano, analisando-se os últimos cinco anos. 

    Para ajudar os leitores a entender um pouco mais sobre esta doutrina política, a Gazeta do Povo falou com o professor da PUC-PR Másimo Della Justina, formado e pós graduado em Economia pela London School of Economics, escola clássica fundada pela Sociedade Fabiana, e com o analista político da Arko Advice, Carlos Eduardo Bellini Borenstein. A partir destas conversas, elaboramos uma lista com os pontos essenciais para compreender toda esta discussão em torno do fabianismo. 

    1. Afinal, o que é socialismo fabiano? 

    É uma doutrina que surgiu no final do século XIX, após o manifesto de Karl Marx, do Partido Comunista, mas, diferentemente deste, os fabianos viram que a transição para o socialismo deveria ser feita de forma gradual, sem ruptura revolucionária. O socialismo fabiano prega igualdade de oportunidade para todos, redistribuição de riquezas e justiça social, mantendo o direito à propriedade privada e à economia de mercado, embora regulamentada pelo Estado, o que também é diferente da proposta da corrente marxista que defendia o fim da propriedade privada e a socialização dos meios de produção. “Ele é considerado um socialismo cor de rosa que aproveita algumas ideias do capitalismo, mas que tem no Estado um regulador da economia e provedor de necessidades básicas”, comentou Della Justina. 

    2. Origens 

    Ao contrário do que muitos podem imaginar, o socialismo fabiano não nasceu na Rússia, mas sim no Reino Unido. Na época o país vivia um “capitalismo selvagem”, nas palavras do professor Della Justina, que resultou em pobreza e péssimas condições de trabalho para boa parte da população. Neste cenário, um grupo de intelectuais britânicos se reuniu e em 1884 fundou a Sociedade Fabiana (Fabian Society), o mais antigo instituto de estudos políticos britânico, conforme descrito no site da própria organização. 

    3. Por que Fabiano? 

    O fabianismo também se diferencia de outras vertentes do socialismo por acreditar que as mudanças poderiam ocorrer de forma gradual, por meio de reformas: evolução em vez de revolução. Foi por esta característica que o movimento ganhou o nome que tem. 

    Trata-se de uma referência ao general romano Quintus Fabius, que durante a Segunda Guerra Púnica (218 a 201 A.C) tinha como estratégia cansar o inimigo e atacar suas linhas de suprimento, evitando confrontos diretos com tropas maiores. 

    4. Quais foram os principais nomes? 

    O casal Beatrice e Sidney Webb e o dramaturgo e jornalista George Bernard Shaw são nomes proeminentes quando se fala em Sociedade Fabiana. Em 1895 os três, junto com educador Graham Wallas, fundaram a London School of Economics, um dos mais prestigiosos centros de pesquisa acadêmica do mundo. O trecho a seguir foi encontrado escrito por Beatrice Webb em seu diário em 21 de setembro de 1894: “Sua visão é fundar, lentamente e silenciosamente, uma ‘Escola de Ciência Econômica e Política de Londres’ — um centro não apenas para aulas de interesses específicos, mas uma associação de estudantes que seriam direcionados e apoiados a fazer trabalhos originais”. O Primeiro Ministro do Reino Unido em 1922, Ramsay MacDonald, também foi um nome conhecido por ser o primeiro membro do Partido Trabalhista a assumir o cargo. 

    5. Qual a influência na sociedade atual? 

    Segundo o professor Másimo Della Justina, ideais do socialismo fabiano foram difundidas e estão presentes em algumas sociedades, como a ideia de que todos devem ter oportunidade econômica, e que, quando o cidadão não tem acesso a ela, seria obrigação de o Estado prover o mínimo necessário para que a pessoa possa sobreviver, dando também oportunidade para que ela possa ter seus próprios rendimentos. 

    Entretanto, na opinião do analista político Borenstein, esta influência é pequena porque a parcela da sociedade que sabe fazer essa discussão de ideologias é muito reduzida. “Principalmente porque depois da Guerra Fria a gente tem um processo em que as ideologias perdem o valor na hora da decisão do voto” 

    6. Existem partidos brasileiros que se alinham com os ideais do socialismo fabiano? 

    O PT (Partido dos Trabalhadores), durante os governos de Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, implementou algumas políticas sociais que vão ao encontro de ideais do fabianismo, como o Programa Bolsa Família e o sistema de cotas nas faculdades públicas. O PSDB, em teoria, também pode ser associado ao socialismo fabiano pelo próprio estatuto que rege o partido, baseado na social democracia. 

    Apesar disso, Borenstein afirma que estes partidos não podem ser considerados socialistas fabianos, porque, embora tenham alguns propósitos em comum com a doutrina, na prática de gestão, quando eles estavam no poder, tanto o governo de Fernando Henrique Cardoso quanto o de Lula e Dilma, se adaptaram à realidade e convergiram para uma política com viés mais de centro e liberal, abrindo mão de alguns programas ou deixando de lado ideologias que deram base à criação dos partidos. 

    7. Por que virou o assunto da moda na roda do Facebook? 

    Desde que tomou posse como prefeito de Sao Paulo, João Doria tem sido alvo de críticas pela denominada extrema-direita por supostamente estar alinhado ao fabianismo. “Vejo que existe um pessoal ligado ao MBL [Movimento Brasil Livre], com tendência mais de direita, que tentam dizer que o PSDB teoricamente representa o socialismo fabiano. Ligar o partido e o candidato deste partido ao socialismo é a forma que os estrategistas deles [pró-Bolsonaro] encontraram para desconstruir a imagem de um adversário que segue o mesmo viés de direita”, comenta Borenstein. 

    O analista político acredita que Doria não seja um socialista fabiano. “Ele é um empresário, a favor de privatizações e desde que assumiu a Prefeitura de São Paulo até hoje não há nada do ponto de vista ético que possa ser usado para criticá-lo. Então esta é uma estratégia de campanha negativa por parte dos estrategistas do Bolsonaro” . 

    Para o professor Della Justina, nas eleições brasileiras a construção da imagem é muito mais importante do que as ideologias. “Eu não diria que ele é socialista fabiano, mas sim que ele apresentará uma ideologia com o objetivo de atrair os votos dos brasileiros”.

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