CAMPO GRANDE (MS),

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    27/06/2016

    Opinião | Brexit – O Reino Unido deixará a União Europeia?

    Não apenas britânicos, mas pessoas no mundo inteiro questionam o futuro do Reino Unido, fora do bloco europeu. 

    O assunto de maior polêmica na mídia recentemente, como a maioria das pessoas ficou sabendo, diz respeito à votação realizada no Reino Unido, para que a coalizão de países liderados pela monarquia britânica – formada por Inglaterra, País de Gales, Escócia e Irlanda do Norte – deixasse a União Europeia, da qual fez parte por mais de quatro décadas. O movimento, conhecido como Brexit (neologismo formado pelas palavras Britain [Bretanha] e Exit [Saída]), teve vitória que ocorreu por uma margem de 52% a favor, contra 48% em oposição, o que representa uma diferença de aproximadamente um milhão e duzentos mil votos, a optarem pela saída do Reino Unido da União Europeia. Defendendo a permanência do Reino Unido no bloco Europeu, cuja capital é Bruxelas, na Bélgica, o primeiro Ministro David Cameron declarou que renunciará ao cargo até o final do ano, provavelmente no mês de outubro.
    Depois da votação, protestos em Londres tornaram-se comuns, exigindo a permanência do Reino Unido na União Europeia. 

    Assustados com as consequências – que já começaram a abalar o mundo de forma irremediável em caráter econômico, com quedas nas bolsas de valores do mercado asiático, que invariavelmente refletiram, com variações, no mercado financeiro de muitos outros países – os britânicos estão muito apreensivos com as possíveis consequências que a saída do Reino Unido do bloco europeu poderá acarretar, tanto a curto quanto longo prazo. 

    Uma coisa é certa: é possível conjecturar péssimas consequências, que ocorrerão em efeito dominó, tanto para o Reino Unido, como para o restante dos países que integram a União Europeia, e evidentemente, para o continente como um todo, que sentirá em sua envergadura os catastróficos efeitos da ausência, em sua esfera de ação e influência, de um dos grandes baluartes da política e da economia mundial, que atuavam de forma vigorosa, em diversas frentes, pela estabilidade do bloco. Insatisfações com a decisão final geraram diversos protestos em muitas localidades do Reino Unido, especialmente em Londres, que cogita pleitear integrar-se a União Europeia por conta própria, caso a decisão do Reino Unido de sair do bloco acabe por vigorar. Igualmente descontentes com a decisão, a Escócia, através de sua porta-voz, a Primeira Ministra Nicola Sturgeon, afirmou que é muito provável que a nação realize um novo referendo pela sua independência, com o objetivo de separar-se do Reino Unido, para integrar a União Europeia, cumprindo assim a vontade de 62% dos escoceses, que optaram pela permanência no bloco. Tendo realizado um referendo em 2014, para tornar-se uma nação soberana, e portanto, independente do Reino Unido, tendo invariavelmente perdido por uma diferença de 55,3% que votaram contra a independência, e 44,7% que votaram a favor, a Premiê Nicola Sturgeon, determinada a cumprir a vontade da maioria dos eleitores, afirmou que a decisão do Reino Unido de deixar o bloco faz com que um novo referendo pela independência da Escócia se mostre como uma possibilidade necessária, que provavelmente ocorrerá em breve, em função de que a Escócia faz questão de integrar a União Europeia. 
    David Cameron, o Primeiro Ministro britânico, defendia a permanência do Reino Unido no bloco.

    Esse tipo de comportamento político pode certamente gerar um efeito cascata, que ameaça acabar com o Reino Unido, muito em breve. Além da circulação de rumores, que disseminam o fim da monarquia assim que a Rainha Elizabeth II falecer, a secessão de um país como a Escócia certamente levará outros países da coalizão, como a Irlanda do Norte, a buscarem a independência. Se isso vier a ocorrer, a fronteira que separa a Irlanda do Norte do restante da República da Irlanda provavelmente será extinta, tornando possível a realização do tão esperado sonho republicano de uma Irlanda unificada, o que representará, de uma vez por todas, o fim do Reino Unido. O futuro do Commonwealth of Nations, nominalmente também submisso ao Império Britânico, composto por cinquenta e três nações que em sua maioria foram colônias britânicas, estando entre elas a Austrália, o Canada e a Nova Zelândia, poderá igualmente enfrentar uma dissolução em decorrência da desintegração do Reino Unido, embora esta organização global composta por dezenas de nações não passe hoje de uma volátil formalidade política, com mais valor teórico do que prático, sem quaisquer funções de caráter pragmático ou funcional. 

    Não obstante, alguns resultados, como a rápida desvalorização da libra esterlina, foi um dos fatores que passou a perturbar o mercado financeiro internacional, demonstrando a frágil situação de instabilidade à qual o Reino Unido se expôs. Com a grande insatisfação de boa parte dos britânicos com o resultado final das votações, e tendo plena consciência do que isso pode acarretar, a longo e médio prazo, podemos esperar, em diversas partes do Reino Unido, mas especialmente em Londres, muitos protestos, da parte de eleitores desesperados para que se reconsidere a decisão. 

    Evidentemente, a saída da União Europeia não é um processo que ocorrerá da noite para o dia. Poderá levar meses, ou até mesmo anos, para que o Reino Unido deixe o bloco. Com diversos aspectos técnicos, burocráticos, financeiros e políticos em questão, deixar a União Europeia constitui uma série de formalidades que certamente se mostrará um processo lento, doloroso, árduo e ardiloso, que fará com que os britânicos questionem a todos os momentos as motivações, as intenções, e principalmente as consequências desta decisão. Caso o Reino Unido decida deixar o bloco, será a primeira nação na história da União Europeia a fazê-lo.

    As negociações para deixar o bloco com certeza não serão nada fáceis, e é provável que tensões permaneçam, de ambos os lados. Embora persistam rumores de que aparentemente os países líderes do bloco tenham oferecido concessões para que o Reino Unido permanecesse, Bruxelas não terá clemência com as negociações que por fim extirparão a participação britânica do bloco. Com ambos os lados buscando valores equivalentes para suprir as perdas que invariavelmente virão com a ruptura política, as incertezas que permanecem mostram que ambos os lados têm mais a perder do que ganhar. Não obstante, políticos e homens de estado britânicos afirmaram que voltar atrás não é uma medida plausível, pois coloca em risco a soberania da democracia, e a vontade da população, demonstrada nas urnas, deve ser respeitada.

    As consequências mais prováveis do Brexit, além de um provável colapso econômico, que pode ou não ser sentido muito em breve, tendo a libra esterlina rapidamente sofrido sua maior desvalorização em trinta e um anos, momentos após a revelação dos resultados da votação, será o subsequente desmembramento de diversas entidades políticas. Além do Reino Unido, que pode considerar-se invariavelmente ameaçado, com a aguerrida chama separatista que virá da Escócia, e consequentemente, da Irlanda do Norte, a própria União Europeia poderá desmantelar-se, se outros países membros sentirem que terão mais vantagens por conta própria, do que fazendo parte do bloco. A Inglaterra, como nação isolada, e não como potência, ou cavalo de força de uma coalizão política, com o fim do Reino Unido – e a inevitável dissolução da monarquia, o que provavelmente ocorrerá muito em breve – se mostrará incapaz de manter o Commonwealth, e o mundo como o conhecemos, com certeza se transformará. O que muitos não percebem é que, na verdade, estamos testemunhando não apenas o resultado de um plebiscito que determina o futuro de uma nação, mas a redefinição do diagrama político, com consequências em âmbito global, que certamente terminará por reestruturar países e redefinir fronteiras (ou acabar com elas, o que possivelmente será o caso, na Irlanda do Norte). Seja como for, nações são criações humanas, e não duram para sempre. Mudanças são necessárias, bem-vindas, e inevitáveis. A questão é ser flexível, adaptar-se e saber aceitá-las. Elas ocorrerão, quer tenhamos disposição em acolhê-las, ou não. 


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